Uma vez que os Estados pós-coloniais estão sobrepostos à realidade das sociedades africanas em lugar de serem uma parte viva e consubstancial delas, é ao nível local, onde as pessoas vivem - as aldeias, os bairros, as cidades, as províncias - que se inventa a futura governação africana.
Levou o movimento de descentralização da década dos noventa para que, segundo as palavras de Ousmane Sy, “a administração regressasse a casa”, que estivesse em vias de tornar a ser uma parte integrante da sociedade. Ora, ao mesmo tempo observa-se que os territórios locais - as cidades, as regiões, etc. -, no mundo inteiro, não são vestígios do passado gradualmente varridos por sistemas modernos de comunicação que conectam instantaneamente todos os pontos do planeta, pelo contrário, tornam se elemento básico da governação e o actor-chave da economia.
É de facto ao nível territorial que se pode gerir simultaneamente as questões económicas, sociais e ecológicas. Além disso, a nossa economia é cada vez mais uma economia do conhecimento em que a capacidade local dos actores para cooperar entre eles, ou seja o capital imaterial do território, se torna o principal factor da competitividade. Por conseguinte, é a partir do nível local que se deve inventar um projecto africano de governação. Não considerando os territórios fechados sobre si mesmos, mas pelo contrário sabendo-os, realmente abertos aos seus vizinhos e ao mundo.
Nenhum real problema das nossas sociedades se pode gerir a um único nível. A distribuição rígida das competências entre cada um dos níveis de governação, da comunidade de base ao mundo inteiro, está condenada ao fracasso. O que pelo contrário é preciso inventar, são os princípios, os métodos e a cultura do exercício de competências partilhadas, da cooperação entre os diferentes níveis de governação. É o que se chama actualmente governação multinível. Bem que a ideia se vai impor progressivamente, ela enfrenta o obstáculo dos preconceitos, a resistência de todos os que estão apegados a um exercício feudal do poder, que querem ser os seus próprios mestres. O princípio de subsidiariedade activa descreve os métodos através dos quais os diferentes níveis podem concretamente cooperar em torno de cada desafio da sociedade.
A conferência será a ocasião de recensear e valorizar tudo aquilo que, nas inovações locais, contribui hoje em dia para inventar a futura governação africana, debater a governação multinível e fazer propostas concretas de implementação da subsidiariedade activa.
Seria difícil pretender que África não dispõe de instituições de integração, desde a própria União Africana, passando pelas múltiplas organizações regionais ou especializadas - a moeda, a economia, o comércio, a gestão da água, etc. - que federam os diferentes Estados africanos. Como para os próprios países, as fronteiras herdadas do colonialismo raramente têm uma realidade humana e histórica profunda. Os intercâmbios humanos e económicos informais, as migrações e o tráfico através das fronteiras porosas são mais ricos que os que resultam dos Estados pós-coloniais. Mas o facto é que os obstáculos de todo o tipo que opõem a esta realidade são infinitas. As instituições intergovernamentais de integração regional por um lado, e as comunidades transfronteiriças por outro, são duas realidades pouco conectadas entre si.
O drama histórico da África é de ter lutado pela independência em nome da construção de Estados soberanos, sobre o modelo legado pelas antigas potências coloniais, enquanto estas, tendo constatado as consequências dramáticas do nacionalismo sobre as respectivas potências, estavam a construir a União Europeia! Com a União Africana e as organizações regionais quis-se simular esta integração regional e continental sem seguir as diferentes etapas que lhe teriam dado consistência. O que se fez foi apenas construir instituições suplementares.
No decurso da conferência debateremos processos permitindo dirigir-nos para autênticas integrações regionais e para uma verdadeira união africana.